Mas então você começa a se
apaixonar pelos telhados. Um a um, você demora cada vez um pouquinho mais para
deixa-los. Era só uma questão de tempo até que algum deles te parasse de vez.
Você olhou para aquele vidro tão belo e translúcido, perfeito em todas as qualidades
que um vidro deve ter. Até os arranhões as lascas tiradas pela intempérie
davam-lhe uma beleza madura, davam-lhe aquele toque sedutor da experiência. Mas
que vidro adorável, você pensou. A perfeita combinação entre o denso e o
rústico. Você ficou mais um dia. E foi ficando. E agora já não te é mais
possível sair. Está ouvindo o vidro trincar? Sim, você finalmente se tornou
pesado demais. Você sabe que deve sair enquanto é tempo. Você sabe que a
tragédia está anunciada. Mas, sem explicação, você resolve ficar. Você não
consegue sair. Aquele vidro é simplesmente lindo demais.
O som do vidro trincando está
ficando cada vez mais alto. Está ouvindo? Eu te avisei. Você vai cair. Agora já
se pode ver os primeiros estilhaços caindo com um estrépito lá embaixo. Milhares
e milhares de quilômetros abaixo. Você nota, agora, o quão alto subiu? Os estilhaços
estão ficado maiores. Meu deus, mais da metade do vidro já se foi. Pule para
fora daqui. Pule para o próximo telhado, ainda dá tempo. Não você não vai. Você
está perdido. Você ainda quer este telhado, ainda que quebrado. Você vai cair.
A última parte do vidro, por fim,
se quebra. E você cai. na velocidade de um meteoro. A gravidade maligna te puxa
para ela, sedenta do seu corpo. Voraz e invencível. Você está caindo. Mas está
apaixonado pela queda. Você é grato por ela. Você esta voltando pro seu vidro,
que te espera lá embaixo. Está voltando pro começo.