Dreams are renewable. No matter what our age or condition, there are still untapped possibilities within us and new beauty waiting to be born.

-Dale Turner-

domingo, 1 de abril de 2012

Fome

Vamos de semana em semana, você disse.  Sem pressão, sem infinitos prometidos, sem mundos investidos, sem pesos amarrados nas costas.  Perfeito, pensei. Justamente o que eu precisava. Justamente o que eu sempre precisei. O não comprometer, o finito. O não permanente e consequente frescor de infindáveis recomeços. Tudo o que eu precisava para ser o apetite que sempre fui. O permanente, e resolvido, o terminado me assustam. Não tenho fome de nada, porque fome é uma necessidade definida, rotineira, orgânica. O apetite tem a inconstância e indefinição do bom evento psicológico que é. Sim, eu sempre precisei mesmo ser um apetite. O medo em mim de não conseguir abraçar o mundo todo porque perdi tempo acariciando um pequeno detalhe da Criação é maior que o próprio medo da morte. É, em verdade, o próprio medo da morte. A morte para mim não é a morte em si. A morte para mim reside na assustadora possibilidade de que ela me encontre antes  que eu tenha conseguido abraçar o mundo inteiro.
Sim, eu sempre vivi para sustentar meus imensos olhos. Sempre gulosos, sempre insaciáveis, sempre na contramão de minha barriga pequena, limitada, assustadiça, incompetente e temperamental demais para se comprometer com qualquer digestão mais elaborada. Não, digerir sempre foi um aprofundamento impossível para mim e, por isso, me acostumei às indigestões, ao sufoco que meus olhos descomunais e desproporcionais sempre me causaram.
É então que vem você e me propõe alimentar-me às colheradas.  Você vem e me propõe pequenas porções de cada vez . Desafia meus irritáveis e impacientes olhos, permitindo apenas pequenos e ocasionais vislumbres do todo. Do magnifico todo que eu ainda estava por conhecer. Você veio com pequenos acordes de uma voz veludada, pouquíssimos e quase silenciosos versos de musicas tímidas. Veio com pequenos sacrifícios, pequenos cavalheirismos. Veio com pequenas noites. Pequenos momentos de presença. Trouxe ingrediente por ingrediente,  às vezes microscópicos, e submeteu cada um deles ao meu assustável paladar. E quando, finalmente, senti o carnaval de sabores que aos poucos trouxeste até mim, o apogeu dos sentidos trazido por suas pequenas e singelas porções me pôs de joelhos. De beijo em beijo. De primeira vez em primeira vez. De uma em uma semana Foi assim, que você me fez ver que nem todas as semanas da minha vida vão saciar a fome visceral que despertaste em mim. Eu disse fome, veja bem.  O desejo pela rotina de te ter, o desejo pela segurança e confiabilidade da tua presença. Parado ao meu lado, saciando-me regularmente, é como te quero. Sim, isso é fome. O apetite já passou. Dele já não preciso.